Catálise e Eletrocatálise

Os organismos vivos se constituem no melhor exemplo de nanomáquinas, proporcionando uma fonte de inspiração inesgotável em nanotecnologia molecular. As transformações que ocorrem nos sistemas biológicos, responsáveis pela manutenção da vida, são catalisadas por enzimas específicas.As propriedades das metaloporfirinas são fortemente dependentes do íon metálico coordenado ao anel porfirínico. Dentre as supermoléculas do tipo M(TRPyP), obtidas pela coordenação de quatro grupos [Ru(bipy)2Cl]+ às meso-tetra(4-piridil)porfirinas, uma das mais interessantes é a derivada de níquel porfirina. Por exemplo, níquel porfirinas podem mimetizar a coenzima F-430 das bactérias metanogênicas, promovendo a redução eletrocatalítica de CO2. Contudo, para que isso ocorra é necessário que a porfirina reduzida tenha acentuado caráter de Ni(I), isolobal com o radical metila. Verificou-se que a atividade eletrocatalítica é aumentada no início da onda de redução de um dos ligantes bipiridina dos complexos de rutênio periféricos. Esse comportamento foi atribuído a) ao aumento da quantidade de elétrons disponível na molécula para promover a reação de redução multieletrônica e b) a um efeito eletrônico induzido pelos grupos [Ru(bipy)(bipy-)Cl] que aumenta o caráter de Ni(I) da porfirina reduzida.Outro sistema de interesse é o citocromo-c oxidase , responsável pela redução tetraeletrônica do oxigênio à água, na etapa final da cadeia respiratória. No final da década de 70, Collman e Anson verificaram que uma cobalto porfirina cofacial, adsorvida na superfície de eletrodos de carbono pirolítico catalisava a mesma reação, tendo sido proposto um mecanismo de reação no qual o O2 se liga em ponte a dois íon Co(II). Em 1990, propusemos um modelo alternativo segundo o qual a Co(II) porfirina seria ativada por meio da ligação de complexos doadores de elétrons na periferia, de modo que atuassem como reservatórios de equivalentes redox e modificadores das propriedades eletrônicas do sítio ativo. Apesar da meso-tetra(4-piridil)porfirina cobalto(II) coordenada a grupos [Ru(edta)] ser praticamente inativa, recentemente mostramos que eletrodos modificados com filmes do derivado coordenado a quatro clusters RuIIIRuIIIRuII são extremamente eficientes como catalisadores do processo de redução tetraeletrônica. Isso pode ser verificado pela corrente de anel muito menor que a corrente de disco, indicando que praticamente todo o oxigênio está sendo reduzido eficientemente à água, mesmo a velocidades de rotação de cerca de 4000 rpm.Por outro lado, o Mn(TPyP) coordenado a quatro clusters de rutênio mostrou ser um catalisador com alta especificidade e atividade para a reação de oxidação de ciclohexano a ciclohexanol, atuando como sistema modelo do citocromo P-450 . A espécie O=MnVP coordenado à espécie Ru IIIRuIIIRuIV foi proposto como sendo a espécie ativa. Pode-se verificar que as porfirinas polinucleares ajustam o estado de oxidação dos grupos periféricos às condições do meio, aumentando a atividade e estabilidade das mesmas como catalisadores redox. A ativação da cobalto e manganês porfirina se deve em parte ao efeito eletrônico induzido pelos grupos periféricos. A coordenação dos grupos terminais não introduz apenas sítios eletroquimica e fotoquimicamente ativos nas supermoléculas. Concomitantemente elas se constituem em novos sítios que podem alterar o modo de interação das mesmas com outras moléculas ou substratos, atuando como cofatores.

Exemplo de uma Co porfirina tetracluster capaz de realizar a redução tetraeletrônica do O2

M(TCP)
RRDE CoTCP

 
  A presença de grupos eletricamente carregados distribuídos simetricamente ao redor do anel porfirínico faz com que estes possam ser utilizados para a montagem de sistemas supramoleculares. Assim, foi demonstrado que as M(TPyP) coordenadas a quatro complexos de rutênio podem ser utilizados para a preparação de filmes estáveis na presença de M(TPPS). Tais filmes podem ser preparados camada por camada pelo método de montagem eletrostática, sendo constituídos de pilhas que alternam a espécie tetracatiônica e tetraaniônica. Estes tendem a se dispor face a face de modo a maximizar as interações hidrofóbicas e eletrostáticas. Esses materiais supramoleculares apresentaram excelente condutividade elétrica próximo ao E1/2 do par Ru(III/II), confirmando a natureza redox do mecanismo de condução. E, devido a alta homogeneidade que impede a aproximação de substratos eletroativos da superfície do eletrodo, um comportamento I vs E análogo ao de um diodo foi observado na presença de K4[Fe(CN)6]. Ion Pair

 
Conducao Os filmes supramoleculares eletrostaticamente montados também apresentaram alta atividade eletrocatalítica para reações de oxidação de substratos redutores tais como nitrito, sulfito, fenol, ácido ascórbico, NADH e dopamina, além de ter uma baixa tendência ao envenenamento, elevada reprodutibilidade e estabilidade. De fato, estudos recentes mostraram que a constante de transferência heterogênea de elétrons para o nitrito, k =2.7x103 dm3 mol-1 s-1, é cerca de duas ordens de grandeza maior que no polímero redox [Ru(bipy) 2(PVP)Cl]Cl. Um sensor amperométrico de sulfito para vinhos foi desenvolvido utilizando eletrodos de carbono modificados com filmes de Co(TRPyP)/Zn(TPPS) em um sistema FIA.