Problemas na formulação de questões e respostas em provas

 

Tibor Rabóczkay

Instituto de Química da Universidade de São Paulo,

São Paulo, Brasil

 

Os conflitos que ocorrem, sobretudo no ensino superior, entre alunos e professores tem origens as mais variadas. Numa sociedade em efervescência é comum, preconceituosamente, taxar o professor de representante da ordem estabelecida e, não sendo um demagogo, poderá ser vítima de um convívio atribulado com seus alunos. Uma das causas mais frequentes da deterioração do relacionamento docente-discente diz respeito a problemas que acompanham as avaliação mediante provas e exames. É tão certa a ocorrência de desentendimentos neste campo que alguns mestres mais "espertos" se recusam sistematicamente a dar cursos teóricos alegando uma irresistível paixão pelo trabalho experimental. Como os conflitos na correcção e revisão de provas e exames podem ter razões objetivas, acreditamos que seja possível - e necessário - eliminá-los ou pelo menos diminuir seu número e sua intensidade. As medidas encontram-se ao alcance.

O pedagogismo, que há algum tempo assola o ensino, presenteou a sociedade com gerações de estudantes de capacidade de expressão e, portanto, de entendimento reduzido. "Foi isso que eu quis dizer!", "pensei que a pergunta pedia isto!", "não entendi a pergunta!", exclamações muito usadas na hora da revisão e discussão da prova, podem indicar uma dificuldade real do aluno para interpretar a questão. E sob a natural tensão que toma conta do examinando, torna-se mais angustiante a questão: como responder?.

Como responder? A ocorrência dessa dúvida conduz a outra: como perguntar? Como perguntar de uma maneira clara que não deixe nenhuma dúvida ao aluno quanto às expectativas do examinador. Se nas respostas nada deve ser subentendido ou deixado por conta da imaginação de quem avalia, o mesmo deve ocorrer respectivamente ao avaliado. O objetivo pode ser alcançado com uma providência bastante simples, ou seja, atentando para a acepção correta das palavras que habitualmente participam da formulação de questões. A seguir são dados alguns exemplos mais importantes dessas palavras com comentários que ilustram a idéia proposta. A análise é restrita ao ponto de vista da elaboração de questões e de respostas.

CALCULAR. Essa palavra deixa pouca dúvida quanto à sua interpretação, entretanto, é necessário que o aluno saiba se deve ou não definir todos os símbolos, ou pode admitir conhecidos os seus significados. Deve ainda estar informado se é esperado que a resposta seja dada com o número de algarismos significativos correto. É preciso salientar que dar a fórmula, somente, não responde à questão - calcular implica na obtenção de um número, de preferência correto ou, eventualmente, de uma expressão. Calcular não significa deduzir, tanto o estudante quanto o docente devem manter isto em mente.

DAR. Equivale a emitir, enunciar, apresentar, expor, enumerar. Não deixa claro o nível de detalhamento pretendido ou exigido.

DEDUZIR. Tirar deduções, sendo a dedução o processo pelo qual com base em premissas, se chega a uma conclusão, ou a uma expressão matemática, em virtude da aplicação correta das regras lógicas. Quando o resultado da dedução é uma fórmula matemática, os alunos tendem a escrever apenas as etapas matemáticas, esquecendo de dar as premissas, definir os símbolos e descrever com palavras as etapas da dedução. Deduzir não equivale a apresentar apenas uma sequência de equações.

DEFINIR. Usado em questões normalmente no sentido de "explicar o significado de ". Ao se tratar de uma expressão matemática é obrigatório explicar os símbolos empregados. Definir não significa deduzir, nem interpretar.

DEMONSTRAR. Provar por meio de um raciocínio concludente. É necessário descrever as condições iniciais e finais, salientando as limitantes. Definir os símbolos que aparecem no decorrer da demonstração.

DESCREVER. Contar com detalhes. Trata-se de uma palavra que pode deixar os alunos algo confusos quanto à delimitação da sua resposta. Por isso, muitas vezes, além da descrição perde tempo com dedução ou demonstração.

ENUNCIAR. Expressar breve, simples e corretamente uma idéia, um princípio. Quem pede enunciar, não deve esperar, ou exigir demonstração, dedução na hora de corrigir o exame.

EXPLICAR. Implica em tornar algo inteligível, claro. Pode-se, e deve-se, exigir a definição correta das condições de validade, e o significado dos símbolos, eventualmente empregados. Observação semelhante às já feitas vale aqui também: explicar não significa deduzir ou demonstrar, como algumas vezes o aluno ou o próprio docente interpretam.

MOSTRAR. Dar a conhecer. Equivale à palavra, sob o nosso ponto de vista mais clara, demonstrar.

RESOLVER. Na acepção de "achar a solução de" é uma palavra clara. Frequentemente ocorre, porém, confusão de expectativas e o examinador espera deduções ou demonstrações ao lado da resolução pura e simples. Outras vezes é o aluno que estende desnecessariamente a sua resposta ao, por insegurança, apresentar dedução das fórmulas empregadas.

Os comentários precedentes estão muito longe de esgotar o assunto o que, aliás, nem era a intenção. Tampouco se pretende que as idéias expostas sejam as mais verdadeiras ou as únicas interpretações corretas. Levantar o problema - tanto ao professor, quanto ao aluno - e iniciar a discussão foi o objetivo. Finalmente: por mais óbvias que possam parecer as observações feitas, grande parte da discussão que acompanha a revisão de provas gira em torno desse tipo de dúvidas.